"Sei o que vão dizer: a burocracia, o trânsito, os salários, a polícia, as injustiças, a corrupção e o governo não nos deixam ser delicados. - E eu não sei? Mas de novo vos digo: sejamos delicados. E, se necessário for, cruelmente delicados." Afonso Romano de Sant'Anna

"... acordar a criatura humana dessa espécie de sonambulismo em que tantos se deixam arrastar. Mostrar-lhes a vida em profundidade. Sem pretensão filosófica ou de salvação - mas por uma contemplação poética afetuosa e participante." Cecília Meireles

Pesquisar este blog

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

A hora do cansaço

As coisas que amamos,
as pessoas que amamos
são eternas até certo ponto.
Duram o infinito variável
no limite de nosso poder
de respirar a eternidade.

Pensá-las é pensar que não acabam nunca,
dar-lhes moldura de granito.
De outra matéria se tornam, absoluta,
numa outra (maior) realidade.

Começam a esmaecer quando nos cansamos,
e todos nós cansamos, por um outro itinerário,
de aspirar a resina do eterno.
Já não pretendemos que sejam imperecíveis.
Restituímos cada ser e coisa à condição precária,
rebaixamos o amor ao estado de utilidade.

Do sonho de eterno fica esse gosto ocre
na boca ou na mente, sei lá, talvez no ar.


Carlos Drummond de Andrade
In Corpo, 1984.

2 comentários:

Danielle Martins disse...

Não conhecia esse poema de Drummond. É lindo!
Beijos!

Mariana disse...

Não conhecia, que lindo! E que sensação mais familiar!

Prezada Tereza, pelos meus últimos posts, se você acaso os leu, deve ter percebido que estive aí na sua terra, BH, ainda que correndo e muito atribulada pelo cansaço. Fui entregar os exemplares da minha tese ao pós-lit. Minha defesa está marcada para o dia 24 de fevereiro, naquele auditório do térreo da faculdade de letras da ufmg, e aproveito o ensejo para convidá-la, onde certamente terá a sensação de "festa estranha com gente esquisita", mas muito bacana.

Um abraço.