"Sei o que vão dizer: a burocracia, o trânsito, os salários, a polícia, as injustiças, a corrupção e o governo não nos deixam ser delicados. - E eu não sei? Mas de novo vos digo: sejamos delicados. E, se necessário for, cruelmente delicados." Afonso Romano de Sant'Anna

"... acordar a criatura humana dessa espécie de sonambulismo em que tantos se deixam arrastar. Mostrar-lhes a vida em profundidade. Sem pretensão filosófica ou de salvação - mas por uma contemplação poética afetuosa e participante." Cecília Meireles

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terça-feira, 11 de janeiro de 2011

NOSSO ALTAR PARTICULAR

Há quem decore a vida na ponta da língua,
outros rabiscam o próximo passo
na ponta do acaso.
Aqui, nessa estação, onde um outono
instrumental inspira a queda das palavras,
minha força escorre poemas
pelo cedro desse palco, assim como
meus pés cravam a fidelidade aos
sonhos desses guris atrevidos que
aqui brotarão virtuosos, aguerridos
com seus estilingues de cordas
vocais de nylon e de aço, apedrejando
a covardia dos homens secretos a si.
Fábula em partituras da Gata de Botas!
Maria e seus Joões cantam o caminho
de volta para o íntimo,
hasteiam leves uma bandeira
toda bordada de mocidade,
doces rendas melódicas, ponto a ponto
terras descobertas, a cada acorde
um ensaio para acordar
um moço jeito de existir
sem a intenção de trocar de mundo,
apenas unir quem não coube
em sua acidez.
Inventamos aqui, nesse solo fértil,
veraneio da arte, palco do palhaço
“rendez-vous”,
um baile de amigos em pleno
velório do falecido monstro que cobria
o horizonte de quem ama o que se pode ser.
Aqui jazz uma solidão ignorante.
Naufragam agora todas as farsas
escritas pelo cão.
Dionísio, arauto de tudo que se une
fantasticamente, abre alas desse
concerto para os desconcertados
se banharem.
A partir de hoje uma nau de solidão
navegará aliviada dos apegos
impossíveis, e uma nova geração
desvendará a ilha daqueles que sonham
antes de dormir.
Notas serão como uma leve pluma,
lançadas ao vento com destino certo:
afago no espírito, cócegas na alma,
mimo na paz, inibir agonias,
afrouxar todo o receio de ser
devaneador.
Na Rua do Acalanto, primeiro peito
franco à direita, casa de janelas
sempre abertas e dispostas ao novo,
jardim de lindas rosas de espinhos
prósperos, varanda ao infinito,
mansão cor de legítimo coração,
em frente ao público dessa nossa solidão.
Ali a pena dançará e nenhuma
câimbra na felicidade,
nem faíscas de isolamento
nos fará desistir de estarmos
“todos juntos”.

Caio Sóh

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